pára-me de repente...
Em Portugal existe uma geração viva que cresceu a ouvir “que pena não teres nascido menina. Assim não ias para a guerra”. O destino era a emigração clandestina ou Angola, Guiné ou Moçambique.
De treze anos de guerra resultaram, só do lado português, cerca de 10 mil mortos e 30 mil deficientes, bem como 500 mil retornados. Muitos que voltaram fizeram-no com uma única certeza: que se mataram ou se viram morrer teriam de conviver o resto da vida com o defunto ou com o assassino, que acontecesse o que acontecesse, enquanto vivessem, teriam de o fazer tendo eles próprios por companheiros… Para esses, o passado nunca morreu, aliás nem sequer foi alguma vez passado.
Esse turbilhão de gente que fervilhou no calor africano e que intensamente aí viveu a loucura da juventude constituiu a geração histórica que assistiu à queda do império, ou melhor, do seu seu mito. Foi a traumática saída de África, para colonizadores e para colonizados (como escreveu o Mia Couto, em África aconteceram dois dramas: o primeiro foi a chegada do homem branco. O segundo foi a sua partida).
Portugal cingiu-se ao canto da Europa, reestruturou o seu lugar no Mundo e orientou-se para a União Europeia. Para muitos, o outro continente manteve-se presente no remorso e na saudade, na fantasia e no pesadelo, no silêncio e no tabu.
Com o fim das guerras civis e com o boom económico de Moçambique e Angola renasceu o discurso retórico da vocação atlântica. São comitivas de políticos e de empresários de orientação neo-colonial que embarcam cheios de presunção e de ideias feitas. Hoje, quando o calor aperta, quem durante o crepúsculo visitar a campa de Salazar, no preciso momento em que o Sol toca a linha do horizonte talvez consiga escutar um ligeiro sussurro: “Para Angola imediatamente e em jeito”.
Esse turbilhão de gente que fervilhou no calor africano e que intensamente aí viveu a loucura da juventude constituiu a geração histórica que assistiu à queda do império, ou melhor, do seu seu mito. Foi a traumática saída de África, para colonizadores e para colonizados (como escreveu o Mia Couto, em África aconteceram dois dramas: o primeiro foi a chegada do homem branco. O segundo foi a sua partida).
Portugal cingiu-se ao canto da Europa, reestruturou o seu lugar no Mundo e orientou-se para a União Europeia. Para muitos, o outro continente manteve-se presente no remorso e na saudade, na fantasia e no pesadelo, no silêncio e no tabu.
Com o fim das guerras civis e com o boom económico de Moçambique e Angola renasceu o discurso retórico da vocação atlântica. São comitivas de políticos e de empresários de orientação neo-colonial que embarcam cheios de presunção e de ideias feitas. Hoje, quando o calor aperta, quem durante o crepúsculo visitar a campa de Salazar, no preciso momento em que o Sol toca a linha do horizonte talvez consiga escutar um ligeiro sussurro: “Para Angola imediatamente e em jeito”.
Enfim… pára-me de repente.
2 Comments:
"Em Portugal existe uma geração viva que cresceu a ouvir “que pena não teres nascido menina. Assim não ias para a guerra”. O destino era a emigração clandestina ou Angola, Guiné ou Moçambique."
Muito IMPORTANTE lembrar tudo isto !
Gostei imenso deste texto ...
Abraço
Realmente texto bem legal!
Sempre é bom lembrar da história
Um abraço pra vc
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